quinta-feira, 29 de março de 2012

Dia de Teatro

A Truta...há dois anos, exactamente a 27 de Março, comunguei com eles o dia do Teatro e houve bolo no fim. A peça era "Ivanov" de Tchecov. O projecto revitalizador; grandes textos, actores com prazer em representar, (aliás esse traço é comum nas duas peças), uma aproximação ao coloquial, reajustando a encenação para captar a vitalidade dos conflitos e das personagens. Ousar "meter buxas" e apresentar uma alegria e um ritmo contagiantes, mesmo com textos "pesados". Dois anos depois, este " Histórias do bosque de Viena" consolida esta ideia. Peça de um autor austro-húngaro, Horvath, apesar de escrita em 1931, permanece estranhamente actual: crise económica, desemprego, insegurança social, contexto ideal para ressurgir o que há de pior no humano: o medo paralisante. Ora o medo gera o apego cego às tradições, e um instinto de sobrevivência voraz, encoberto por uma capa de princípios que não são mais que cínicas justificações para acções cruéis e egoístas. Da indiferença à desgraça dos outros, às ideologias "salvadoras", como o nazismo, é um passo curto. No fim, não havia bolo, mas uma tristeza qualquer, um clima de ocaso. Leu-se Malcovitch e denunciou-se a asfixia das artes do Teatro por falta de verbas. Senhores, são pães, acabaram as rosas!!

quarta-feira, 21 de março de 2012

As imbecilidades do sistema de ensino

Como professora sou refém de uma série de "modos de procedimento uniformizados" e "critérios uniformizados". Refém porque me exigem que o faça. A ideia é que a avaliação possa ser igualmente realizada por todos os intervenientes. Todos devem aceder à mesma contabilidade.O modo mais fácil é matematizar todos os elementos da avaliação, até aqueles que não são, pela sua complexidade, matematizáveis. Nota-se há uns anos, que a ideologia da uniformização, é uma das consequências de uma ideologia economicista que quer harmonizar dois factores antagónicos: a individualidade dos alunos, por um lado, exigindo ao professor estratégias individualizadas para certos alunos e, por outro, uma uniformidade de critérios que é cega a factores particulares. O resultado é um trabalho infinito com números e médias, para chegar ao rigor. O rigor da avaliação é apenas uma forma de tapar com intenções científicas, o que é uma intenção economicista: encontrar uma fórmula de sucesso para permitir que os alunos passem de ano sem esforço, recorrendo para isso a uma multiplicação infinita dos factores de avaliação. Nessa parcialização perde-se de vista o todo e o essencial porque se relativizam todos os factores, como se na perspectiva da aprendizagem de uma disciplina todos pudessem ter igual valor. Enfim, um chorrilho de imbecilidades, uma instrumentalização de todos, alunos, professores, educação.

quinta-feira, 15 de março de 2012

pat joli

onde está? em que lugar ou o quê? um fio, talvez, uma escuna no veio fluído,
no nevrálgico barro da mão, talvez,ou não, prestidigitação.

à superfície uma embriaguez ou uma pendular vertigem

serpentina ou artifício à vista ou não, talvez um outro sangue gorgolejante

branco véu desenrolando da artéria para o azul irremediável do céu

flexível vime ou lenço na maçã perdida de Adão, onde está? ao menos só, menos só que a voz, certo, rompendo, certo. absorvido pela areia no centro denso podendo transformar-se rapidamente em tanque, ou rio, ou marcha lenta. esgravatando.

as mesmas palavras, as gastas, e as novas, socorrendo exaustas a frio onde era corpo quente.


imagem: Ana Mendieta

quinta-feira, 8 de março de 2012

fiar-se no disco rígido

podes sempre fiar-te no disco rígido, este, vejo-o nitidamente, redondo e duro, retém com invulgar precisão o que o teu disco demasiado mole (as células que produzem os pensamentos da memória) não pode, não sabe, já não tem espaço para guardar. Mas, no mais importante, o disco rígido falha; a memória de um beijo, uma frase dita num certo íngreme momento, uma madeixa de cabelo a ir pelo ar ou o meu pai com os olhos encolhidos do fumo de uma braseira. Tudo isto é vulgar, eu sei, conversa de otorrino com urticária, mas estou sinceramente empenhada numa técnica inovadora de não reter, deixá-lo, a memória que me pregue partidas inconvenientes. Antes do disco rígido tinha as minhas cábulas, escrevinhadas em tudo o que fosse liso e, claro, a panóplia de "instrumentos para reter os momentos", imensos e sôfregos inimigos de Cronos. Falham todos, acho que vou abandonar-me, não lutar mais, deixar que fique o que tem mesmo de ficar. CEDO, CRONOS!!!!