terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

sorte

o tamanho ou forma de uma vida vê-se tarde e ainda assim mal. muitos só a vêem depois de morrer, outros medirão o que eles não souberam ou não puderam medir. a imagem do Van Gogh é tão paradigmática quanto inócua para esta afirmação. há factores a ter em conta que só se compreendem com distância, grande distância, o da sorte é um deles. justiça ou sorte? sempre acreditei numa justiça, Deus era o socorro mas a razão também, a razão engendra boas justificações para conferir justiça a este ou aquele acontecimento ou acção. posto isto, para dizer que muitas vezes não somos bons juízes do nosso quintal, engendramos toscas apologias da vidinha que levamos, ou toscas queixas. Abençoar a sorte e deitar ao vento as mais sólidas respostas. quem disse que a sorte não era a mais complexa e impenetrável das musas? quem segurou por debaixo do traseiro a desgraça havia de a olhar nos olhos, fixamente, quem a sentiu, empurrou-a para longe, fixou o olhar na plúmbea rosada da manhã, alvoreceu, meia tonta, não vociferou, resguardou-se da nortada e sonhou, sonhar é bom para encontrar o que seja,nos sonhos a vida cresce ou míngua mas não pesa tanto.

7 comentários:

g disse...

gosto dessa sorte que vira sonho e tem gestos de gente, para mim é mais o momento certo, mas cada um mede a dimensão da sua.

(esse carro fez-me lembrar algo;)

g disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
helena disse...

Gosto desse acaso que é sempre prazenteiro. Tem a competência de se tornar sonho e nunca pesadelo...

Mas cada caso é um caso, e o acaso nem sempre se manifesta feliz, às vezes, é mesmo ocaso.

(como eu gosto de palavras. Será por acaso?)

R. disse...

A sorte existe, sem dúvida. É o acaso com consequências felizes. Atribuir ao acaso a responsabilidade própria é entregar-se à inconsequência e à aleatoriedade das coisas (Não significa que o recuse peremptoriamente). De qualquer modo, se a sorte for benfazeja, para quê racionalizá-la? O melhor mesmo será aproveitar o vento de feição. Se pelo contrário, o acaso trouxer a desgraça, vale tudo para esconjurá-la e "empurrá-la para longe". E quem sabe se manhãs de "plúmbea rosada" não serão um bom antídoto...

via disse...

g: esta fotografia é de Annemarie Schwarzenbach (nome complicado). O momento certo que nem sempre é um resultado lógico mas sim um puro acaso.

helena: transformar o acaso em ocaso parace-me quase um reflexo inconsciente cuja leitura é manifestamente tendenciosa. Ocaso e acaso são semelhantes na grafia mas muito diferentes no significado. Não te parece?

R: racionalizá-lo para lhe atribuir valor no computo das vidas é apenas uma forma de não nos darmos excessiva importância, tão pouco medir todas as vidas apenas pelo mérito. parece-me que esse juízo padece da cortesia perante o que nos escapa que é muito. abraço.

g disse...

era só para confirmar;)

R. disse...

Absolutamente de acordo,via. "Medir as vidas pelo mérito" seria não só redutor, mas sobretudo arrogante. Além disso, o juízo sobre o mérito ou sobre a vida individual é algo que só ao próprio compete.

Abraço.