quarta-feira, 29 de abril de 2009

Enquanto ia na estrada, fina película arrepiada que cobre a terra, circular, pensei que isto de ir para lá e para cá, dentro dos carros, numa terra quadrificada, tem o seu quê de foleiro (fujo ao absurdo como o diabo da cruz). Basicamente somos apanhados nas redes e dentro delas fingimos que somos qualquer coisa de importante e bom e assim estimulante mas não, nenhum peixe gosta de ser pescado, porque fica sem oxigénio e morre. Tout court. A morte é a morte, mais nada. Quantas horas passo aqui ao computador? Extasiada…irritada ou simplesmente nada, passa-se. Quantas? Falo, trabalho, compro, contacto, tudo sem levantar os olhos da caixa. Apanhada. na rede. De nariz afocinhado num sistema virtual complexo, completo, rentável, eficaz , sedutor. Mas um sistema e cada um de nós obrigado, submetido, de livre vontade, pensamos, idiotice, não há alternativa. Na aula cada aluno tem o seu portátil, cada sala o seu computador e ecrã de projecção ligado…
uma amiga apaixonou-se recentemente. Entusiasmada no primeiro mês, agora vê o seu apaixonado sentar-se ao computador até de madrugada. ela fica na sala a ver TV e depois vai para cama…sozinha. O que estou eu aqui a fazer…pergunta-se…simples retórica de põr a pergunta só para não dar de caras com a resposta...
Imagem: reprodução de um quadro de Yves Klein

domingo, 26 de abril de 2009

Este 25 de Abril lembrei o meu pai, a espaços, enterneci-me com ele, passeei um pouco pelo Chiado e na Igreja, conversei em silêncio, estava tomada da exaltação de viver momentos exigentes, várias vozes entravam em litígio e umas mais que as outras falavam mais alto. O eco da revolução com a sua poesia, o cravo vermelho no casaco porque ainda assim soprava um vento frio e o Cristo crucificado em dor. Não me posso libertar das minhas prisões, serei sempre uma individualista, o que me levou ao Chiado neste dia não foi a militância da causa porque é nos nossos actos quotidianos que se mantém a luta, foi uma solidariedade amorosa, uma necessidade de estar lá, de acompanhar quem connosco compõe o tracejado do nosso destino. Os meus motivos do coração são sempre individualizados. Sempre assim foi.Tentava encontrar uma harmonia ou uma ideia conciliadora entre esses sentimentos contraditórios, a dor e a alegria do momento. Um Cristo, um cravo vermelho, o incómodo do fecho das calças que não se sustinha, a dor de não poder comemorar com o meu pai, a luz promissora de uma tarde de sábado e a estreia que se adivinhava e na qual não podia falhar. As pequenas coisas debatiam-se tu cá tu lá com as grandes como se no escaninho da nossa alma tudo tivesse igual importância.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Preciso de lançar palavras, pensar e dizer, amassá-las nas palmas das mãos, desensombrá-las, salivá-las. Reconstruir casa jardim e quarto com seus abat-jours imaginários mais o espaço circundante, a estrada, o frágil sentimento, a atmosfera do corpo, a rede onde baloiço, o piano onde toco se fosse capaz de compor e os dedos que cegos serão guiados sem palavras. Volto à noite, só, à noite e o eco das palavras enreda cidades e fortificações, sempre entre uma coisa e outra, o desejo, submersão em água pura empurra a arquitectura com que vamos tecendo o medo, de novo em fuga com o rasto das palavras que deixamos. Sou só eu, e o escuro da noite, a memória é um deus cansado e doce de unhas cortadas ao sabugo e qualquer uma , qualquer uma das palavras com que do éter me vou entendendo, é um palácio antigo onde se derrama o mel.

segunda-feira, 20 de abril de 2009



O AUTO DA ÍNDIA de Gil Vicente, depois de 20 anos volto ao Teatro, tá tudo convidado, é na Sociedade recreativa Os Unidos de Leceia no dia 25 de Abril!

" Que lei me dais vós senhora? Digo que venhais embora!"

quarta-feira, 15 de abril de 2009

das sete que há em Lisboa, esta é a minha colina, a da Graça, dou de barato o nome que encanta, prezo a mistura, vamos aos fados, ao St.António, à feira, ouvir clássicos, perder o princípio e o fim das ruas ao Sol. Naquele Liceu, ali mesmo em frente, fiz os exames do Propedêutico, por aqui na Feira passei incontáveis sábados desde o nascer ao pôr do Sol e, apesar de certas zonas de Lisboa estarem de cara lavada mas incaracterística, e outras ruirem sem apelo nem piedade aos olhos de todos, a Graça vai passando altiva como a marcha, fiel, assobiando para o ar.

terça-feira, 14 de abril de 2009


ainda assim porquanto nada mais no mundo pudesse haver para esperar ou ansiar eu esperaria e ansiaria por ti.

sábado, 11 de abril de 2009

O calendário religioso e as procissões criam-me sempre uma interrogação: aquelas pessoas que seguem os passos de um Cristo que imita o sofrimento do Cristo histórico ou Bíblico e se parecem com aquelas que com as suas túnicas o seguiam, os cristãos, terão compreendido a mensagem? Serão mesmo aquilo que na sua mistificação acreditam? Tenho inúmeras dúvidas. Encontro-lhes sempre uma pretensão que não se coaduna com a sua condição, é pretensão da verdade e isso causa-me sempre algum espanto. Não que a julguem ter encontrado, pois esse direito assiste-lhes mas que sobre essa mesma luz possam julgar os outros como perdidos. Os perdidos da Fé, seriam eternamente os carrascos, os materialistas da história hoje repetidos e acusados. Não tenho dúvidas sobre a poesia e a beleza do ensinamento de Cristo, mas tenho muitas dúvidas sobre o modo como o entendemos e sobre a forma como pode ser utilizado. Por isso, esta Páscoa, farei a penitência da reflexão, como faço sempre, mas continua a repugnar-me a arrogância, essa mais do que qualquer outra coisa, afasta-me dos cristãos praticantes/beatos e aproxima-me dos que sofrem, de todos os que sofrem com ou sem Fé.

terça-feira, 7 de abril de 2009

crónica das amendoeiras em flor que não chegámos a ver

Algarve.Lagos, mais propriamente, apartamento 153. A avó dorme copiosamente enquanto na TV , as criancitas amestradas pulam e esganiçam. A noite já caiu há algum tempo e a Magui levitou três vezes numa clara demonstração da insustentável leveza do ser. A mim, titi, deixaram-me a falar sozinha e eu resolvi-me a começar este discurso com as amendoeiras em flor Ah Ah! e as estevas em flor! que não chegámos a ver. Doravante havemos de ter mais cuidado no modo como nos pomos à estrada, teremos de vir munidas de chumbo para não levitar e de amêndoas de Páscoa para adoçar a boca caso as amendoeiras corram demasiado depressa à nossa frente. A propósito, a presença do Obama em Praga é histórica e o seu discurso a favor dos acordos de Quioto, o modo como ele fala e não só o que diz,emocionaram o meu coraçãozito de papel amachucado, ai pudesse eu ser outra em outro tempo! Mais à frente!
a fotografia é retirada da net.