quinta-feira, 8 de março de 2012

fiar-se no disco rígido

podes sempre fiar-te no disco rígido, este, vejo-o nitidamente, redondo e duro, retém com invulgar precisão o que o teu disco demasiado mole (as células que produzem os pensamentos da memória) não pode, não sabe, já não tem espaço para guardar. Mas, no mais importante, o disco rígido falha; a memória de um beijo, uma frase dita num certo íngreme momento, uma madeixa de cabelo a ir pelo ar ou o meu pai com os olhos encolhidos do fumo de uma braseira. Tudo isto é vulgar, eu sei, conversa de otorrino com urticária, mas estou sinceramente empenhada numa técnica inovadora de não reter, deixá-lo, a memória que me pregue partidas inconvenientes. Antes do disco rígido tinha as minhas cábulas, escrevinhadas em tudo o que fosse liso e, claro, a panóplia de "instrumentos para reter os momentos", imensos e sôfregos inimigos de Cronos. Falham todos, acho que vou abandonar-me, não lutar mais, deixar que fique o que tem mesmo de ficar. CEDO, CRONOS!!!!

3 comentários:

L.S. disse...

Faz parte da memória o esquecimento,por ele fica sempre, em nós, o mais importante...
Ab.

R. disse...

A acção corrosiva e inevitável do tempo sobre a memória. Quem sabe se para lá do efeito nocivo, não terá também um efeito depurador? Talvez "o que tem mesmo de ficar" seja, afinal, o que verdadeiramente importa.

Um abraço e um bom fim de semana.

via disse...

LS: vero.estranha selecção.

R: acreditemos que sim, como prémio de consolação!! Abraço