quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Quem tem medo de Virginia Woolf?
















Na livraria do Teatro D.Maria II contemplo a exposição fotográfica sobre o autor desta peça: Edward Albee. Um homem bonito, um homem que não teria problemas com as mulheres. Este facto não será por si próprio determinante, ninguém sabe o que esconde a beleza, perversidade ou bondade, a beleza física é um dom que ameniza a vida do seu portador e o inclina naturalmente para reflectir o que recebe, nós somos, acredito nisso, uns reflectores mais ou menos consequentes. Quando se trata de criadores a questão é mais tortuosa porque a necessidade de criar é sempre indício de um excesso ou de uma carência, um desequilíbrio entre autor e mundo cujos contornos seriam morosos e ainda assim indefiníveis. A obra pode ser a soma destes factores, uma soma que tem mais parcelas, mas a mim interessam-me estas. A peça, burguesa (quero dizer, palavrosa, psicologista, dramática) tem a tortura dentro dos limites de um certo bom gosto intelectual, tortura resultante do tédio de uma vida boa. A visão confiante no amor e nas relações humanas não fica demasiado abalada. Na verdade, aquelas personagens torturam-se com meticulosidade mas não se deixam, não se matam, não mudam um milímetro aos seus hábitos ou personalidades, tudo fica como antes, tudo parece um jogo, nada mais, um jogo para fugir ao tédio das noites e dos dias iguais. Todavia a fuga é um escape para perpetuar a mesma situação infinitamente, sem chama, como náufragos agarrados uns aos outros, siameses na miséria, incapazes de a mudarem, diria até, comprazendo-se nela. Volto ao retrato do Albee, a beleza ameniza os contornos mais rudes e escarpados, o dinheiro também, se juntarmos a estes ingredientes o conhecimento percebemos o carrossel vicioso da peça. Um carrossel onde as criaturas gemem nos gonzos, mas nunca se desarticulam.

6 comentários:

R. disse...

Ontem como hoje: o dilema entre o óptimo e o possível; a preferência pelo "certo" em detrimento do "incerto", ainda que por isso se sofra e se inventem infinitos subterfúgios. Até ao dia em que caem as máscaras. E (haverá) quem não as usa?

hlebre disse...

Tortura de manutenção.
E, ainda assim muito sofrimento.

Eu tenho medo de Virgínia Woolf.

hlebre disse...

Tortura de manutenção.
E, ainda assim muito sofrimento.

Eu tenho medo de Virgínia Woolf.

via disse...

R: é verdade a segurançazinha burguesa, por um lado faz florescer a economia por outro arrasa a arte. abraço

hlebre: Não tenhas, ela é que tem medo de ti.

R. disse...

e por vezes a arte "arrasa" a burguesia, confrontando-a consigo própria ;)

via disse...

R: sim, é um auto-retrato corrosivo!