O
coração é um órgão de fogo. Queima e arde. Tudo o que se faz com o coração
agita-se tremulamente no ar, escoiceia, gasta o oxigénio em volta, intoxica,
deixa um torpor nos membros, uma agitação contínua, um desenrolar de parábolas
na cabeça, momentos e enxames de sensações contrárias. Há que voltar a colocar
nele a ordem e a resistência começa: como direcionar o fogo se os limites se
diluem? Se quando os colocamos logo sentimos arder noutro lado? Não nos
inclinamos naturalmente para a destruição. Não. É para a natureza que falamos,
e ela reenvia-nos o eco de uma voz secreta, de um desígnio. Se ardemos é para
depurar, diz-nos a natureza, se custa, é porque também o álcool sobre a ferida
custa mas sara. De novo a resistência, esse álcool abre outras feridas, se
esta sara outra sangra. Inclinamo-nos para o tempo, nele descansamos a cabeça. Que venha o tempo diz a natureza, e tudo volta ao princípio e não há tempo mas
uma irrupção de fogos que não cessam. Coração, coração se tu soubesses, se tu
pudesses resolver-te a fiar, a costurar, ou se tu soubesses cantar em vez de
gritar, talvez o teu canto pudesse seduzir as pedras, talvez o teu canto embalasse
o medo, talvez o teu canto restituísse ao fogo o seu perdido dom de
encantamento.
5 comentários:
Caramba, via, como sempre reitero a minha convicção: talvez o teu canto devesse ecoar mais longe...
Um abraço.
Palavras de quem está mais além...
Ob.
Ab.
belo e triste.
R: e ecoa, aí em Braga, são 400 Km! Abraço e obrigada
LS: Mais além, aqui à distância de um movimento do dedo.
sónia: ´sim, acho que sim.
:)
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