sexta-feira, 16 de maio de 2014

capicua



Numa  certa altura da vida falta-nos tempo, não porque temos muitas coisas mas porque somos mais lentos  e ainda desejamos muito, como se nada nessa lentidão nos fosse familiar. O motor, a força tempestade,  entrou em desaceleração e a percepção desta súbita mudança faz-nos querer chegar a todos os lados que o desejo laço tinha preguiçosamente adiado. Antes de parar, de parar definitivamente. Dentro de mim há também uma figura absorta, uma marioneta  a que temos de puxar pela mão porque se quedou embevecida pela luz do próprio tempo a passar, assustada pelo absurdo de poder parar, como quando alguém corre atrás de nós com uma arma e o horror prende-nos as pernas, não conseguimos fugir, uma espécie de torpor hipnótico, talvez, um rodilho de silhuetas mudas seguram-se no limite. Os meus dois: o que observa espantado um outro mergulhado no pântano luminoso, no extravio absíntico da languidez da queda. Um tem  pressa demais e  o outro, nenhuma.



3 comentários:

CCF disse...

Conheço esses duplos dentro de mim, mas o que tem pressa ganha mais...com a idade, no entanto, não sei...

~CC~

via disse...

CCF: com a idade os mecanismos ficam todos com folgas...eheheh
Bom fim-de-semana.

cs disse...

mas nas folgas entre os diversos fragmentos existe memória?