
Preciso de lançar palavras, pensar e dizer, amassá-las nas palmas das mãos, desensombrá-las, salivá-las. Reconstruir casa jardim e quarto com seus abat-jours imaginários mais o espaço circundante, a estrada, o frágil sentimento, a atmosfera do corpo, a rede onde baloiço, o piano onde toco se fosse capaz de compor e os dedos que cegos serão guiados sem palavras. Volto à noite, só, à noite e o eco das palavras enreda cidades e fortificações, sempre entre uma coisa e outra, o desejo, submersão em água pura empurra a arquitectura com que vamos tecendo o medo, de novo em fuga com o rasto das palavras que deixamos. Sou só eu, e o escuro da noite, a memória é um deus cansado e doce de unhas cortadas ao sabugo e qualquer uma , qualquer uma das palavras com que do éter me vou entendendo, é um palácio antigo onde se derrama o mel.