terça-feira, 28 de setembro de 2010

a gaivota, ou quem não se tornou, pelo menos uma vez, repetitivo?


ainda "A gaivota" e o desencontro


1ª CENA 1º ACTO


Medvédenko: Porque anda sempre de negro?

Macha: Estou de luto por mim própria. Sou muito infeliz.

Medvédenko: Porquê? (Pensativo) Não compreendo. Tem saúde, o seu pai não é rico mas vive sem dificuldades. A minha vida é bem mais dura que a sua. Não ganho senão 13 rublos por mês sobre os quais me descontam um tanto para a reforma, e não ponho luto por isso...

(sentam-se)

Macha: O dinheiro não tem importância. Um homem pobre, pode ser feliz.

Medvédenko: Teoricamente mas na prática...tenho à minha guarda a minha mãe, duas irmãs, um irmãozinho, eu próprio... e apenas 13 rublos...Havemos de comer não é verdade? O chá, o acúcar são necessários. O tabaco é preciso! Experimente pôr-se na minha situação.

Macha: O espectáculo está quase a começar.

Medvédenko: É verdade. Com uma peça de Constantino Gravilovitch e a participação de Nina Zaretchnaia. Estão apaixonados um pelo outro e hoje, as suas almas vão-se unir no desejo de oferecer uma só imagem dramática. Enquanto a sua alma e a minha nada têm em comum. Amo-a, a nostalgia afasta-me de casa. Faço todos os dias 6 verstas para vir aqui outras tantas para voltar e não encontro da sua parte senão indiferença. É compreensível. Não tenho meios de fortuna, não pertenço a uma grande família. Quem quererá casar com um homem que nem sequer tem comer para si?

Macha: (Toma uma pitada de rapé) O seu amor sensibiliza-me mas não posso corresponder-lhe, mais nada.
abre assim a peça. estão ali sentadas duas pessoas, uma declara o seu amor e as contas a pagar, a outra projecta-se num futuro, num espectáculo que irá começar e do qual ela não é senão espectadora. ambos espectadores. nós como eles.espectadores. os protagonistas irão ser aqueles para quem nada é solúvel, é tudo irremediável, vibra e parte, não esperam mas são esperados.

4 comentários:

Unknown disse...

Esta noite confesso, um pouco envergonhado, ainda nem sequer ter lido «A Gaivota»

Boa noite, Via

R. disse...

A auto-comiseração é a mais 'paralisante' das estratégias. Evito-a como o diabo evita a cruz.

via disse...

JPD:mas não é coisa para ler mas para ver, é uma peça de teatro, só ganha vida em cima do palco ou no cinema. Há em filme: a Nina é a Vanessa Redgrave, o realizador Sidney Lumet!a ver!Boa noite!

R:não lhe chamaria auto-comiseração, tende piedade!

R. disse...

tenhamos, pois!