quarta-feira, 17 de outubro de 2012

oficio de escrever

De todos, este foi o ofício que sempre quis ter. Mas nunca me lembrei de inventar personagens e histórias, a criação de um mundo paralelo e plural nunca me interessou na escrita que desejava, o ofício transpirava-me a confessional, solitário, escavando  dentro de emoções, sem artifícios técnicos. Queria falar de sentimentos,  essa amálgama bravia que a própria linguagem parece não dar conta. Queria inventar na linguagem e não servir-me dela. Não sei porque quero isso, o imaginário do escritor à sua mesa de trabalho com a máquina de escrever, sozinho frente aos elementos, lutando contra o génio invisível da passividade, do cansaço ou da indiferença, fumando e bebendo, convocando pela sua entrega uma verdade, crua, a sua verdade, aquela que resulta do acto de criação, era a imagem perfeita onde todo o mal e mesquinhez humana poderiam ser resgatados. A Arte é de todas as manifestações a que mais se aproxima do absoluto, sei-o bem, já experimentei esse fulgor, essa tragédia grau zero da reconciliação. Faltou-me talvez a coragem de ir até ao limite, de crer até ao fim. Tive medo do mundo ou de mim, não sei bem, recuei. Não há grandeza no recuo, mas pode haver outras formas de retomar o fio deixado para trás, não acredito em vocações falhadas, embora a ideia possa seduzir por momentos, dar alguma dignidade ao que nunca chegou a ser.  Também não me interessa saber porquê. Todos os dias me convenço que ainda pode acontecer, penso ser essa a estratégia dos falhados,  prefiro chamar-lhe esperança. Há luz que baste neste céu para todas as formas se revelarem.
 

5 comentários:

cs disse...

uau...que texto!

CCF disse...

Podia ter escrito tal qual!
Por isso compreendo-a muito bem. Mas já deixou de doer.
~CC~

Helena Serrão disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
via disse...

cs: não sei bem se gostaste ou não, de qualquer modo obrigada.

CCF: Não é uma dor, é antes uma constatação.

cs disse...

gostei muito:)