

dia 27 é dia de teatro. desde o princípio que soube celebrar o Teatro, faço-o porque me sinto traidora, infame, cínica, e nada como a má consciência para nos mover ao altruísmo. este ano fui ver Ivanov ao Maria Matos, o ano passado levava peça a cena, peça ainda inacabada como quase tudo o que faço, alinhavo, mesmo assim cumpria o repto, sacudia a culpa de não me esforçar para dar melhor voz ao chamamento. há quem seja chamado a Deus, eu fui chamada para o Teatro e nem gosto especialmente dele, é uma relação familiar, uma coisa de não escolher , de ser assim , nem é uma fatalidade, mas surpreende-me, só isso.
voltando à peça, frases dos actores largadas ao improviso arrepiaram-me, não foi Tchékov certamente que escreveu " só cá faltava mais este!" e outras barbaridades surgidas ao acaso, para ser divertido. sacrifique-se o texto, a bem do espectáculo,até se podia aceitar se fosse um texto qualquer, mas Tchékov não é "um qualquer", meter buxas a heito para simplificar a modorra das frases parece-me desleal. (resta saber se a lealdade tem alguma coisa a ver com arte, até nem tem) mas corta a melodia do texto, conspurca-o. (nem sei como dizer isto porque sinto-o mas depois dito soa a moralismo de pacotilha) Mas este Ivanov tem o mérito de nos confundir, ficamos a remoer: espera, isto é tragédia ou comédia? ora essa dúvida coloca o dedo na ferida, de facto Tchékov faz a tragédia parecer ridícula, uma tragédia ridícula num mundo ridículo onde o amor tem o mesmo valor de uma pescaria ao sável.
Imagem do Grupo "A TRUTA" e Tchékov