domingo, 11 de julho de 2010

a rapariga abordou-nos à mesa, a meio das sardinhas. continuámos a comer. mostrou uns saquinhos com uns artefactos, colares e pulseiras, e percebi logo mesmo sem lhe ver a cara, talvez pelo tom de voz, que era a Teresa. Os colares que vendia eram toscos, mas avancei temerária para o primeiro, antes que ela me reconhecesse, queria despachar aquele mal estar. A Teresa abandonou o 10º Ano quando ficou grávida, foi sempre maltratada pelos colegas porque era fala barato e mentia muito, inventava. a vida dela não tinha sido fácil mas vè-la assim, quase a mendigar, com trinta anos, custou. tive medo que me reconhecesse, da última vez tinha inventado uma história qualquer de um emprego bem pago na TAP, e agora teria de admitir que era treta. mendigar a estranhos não faz mossa mas a gente conhecida é humilhante, acho eu, se calhar não é. Bom, a tarde de sábado.
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Fotografia de Anders Petersen

9 comentários:

Rosa dos Ventos disse...

Tanta Teresa que anda pelas nossas ruas a tentar sobreviver...

Abraço

R. disse...

Se se mente a conhecidos, é porque mendigar deve efectivamente fazer mossa... Ter a delicadeza de evitar uma, ainda que eventual, humilhação é um gesto de respeito e de humanidade. Fazer notar que há neste mundo "Teresas", é uma forma de combater a indiferença.
Um abraço e os votos de uma semana "edificante" :)

via disse...

Rosa dos ventos: É verdade, muitas mais do que seria razoável.abraço

R: viste bem, mentir para sacudir a cabeça ao que corre mal,para que ninguém se compadeça do infortúnio.comprar um colar é pouco. fica-nos uma sensação de impotência.
novos votos, eheheh de bons dias por aí em Braga

CCF disse...

Um terror de ser Teresa tem habitado os meus dias, em parte pelo bocadinho da Teresa que habita uma parte da infância/adolescência, em parte pelo mundo do emprego precário em que ainda me movo tantos e tantos anos depois de ter começado a trabalhar. E ainda assim, ela vende colares, ela não desiste, apesar de todas as sombras que a devem habitar. Escreve sempre sobre ela(s), assim não as esquecemos. E comprar um colar é pouco, mas ainda assim alguma coisa.
~CC~

Barbara disse...

"La violetera" dos colares.
Talvez pudesses ver alguma poesia nela.

R. disse...

Obrigada, via :) Têm sido dias bem mais frescos e, por isso mesmo, propícios ao trabalho, que felizmente nos toca. Um abraço e uma boa continuação na (também) minha querida capital.

R. disse...

Obrigada, via :) Têm sido dias bem mais frescos e, por isso mesmo, propícios ao trabalho, que felizmente nos toca. Um abraço e uma boa continuação na (também) minha querida capital.

Rui disse...

há mossas que, no meio já de tanta amolgadela, nem se sentem

via disse...

CCF: se serve de consolação.mas eu sei que não serve, todos os dias conheço novas pessoas com vidas dependentes do dia seguinte, que não sabem se daqui a um mês terão trabalho.é injusto, o direito ao trabalho é um direito de todos. direito inalienável. que esta crise terá de passar e vai passar. e que nada sendo certo, nem o que parece mais sólido não isenta ninguém de ficar nessa situação.bjo

Barbara: certamente, o seu modo de esconder os desaires com uma contagiante boa disposição!

R: Bom trabalho, é nossa, sem dúvida, patilhamo-la.

Rui; a imagem é excelente.